por Christiane Ribeiro*
Ver o Campo do Abaeté Atlético Clube reformado, na expectativa de voltar a sediar grandes partidas de futebol e revelar novos craques do esporte é uma grande alegria para o dentista aposentado Rômulo Álvares Soares, 89 anos. Ali, ele viveu alguns dos melhores momentos de sua infância e juventude.
Apesar da baixa estatura, já foi carregado nos braços pela torcida apaixonada e aplaudido como um dos grandes goleiros do time. Foi o que aconteceu, por exemplo, em 11 de julho de 1955, quando o time abaeteense enfrentou o Atlético Mineiro no Estádio da Chacrinha. “Como eu era um goleiro baixinho, o Amador conta que eles abaixaram a trave uns 10 centímetros para eu poder jogar. O povo chegou empolgado e ninguém foi conferir tamanho de trave não. Nessa época, o presidente do Atlético era o Inácio Tunico, e o técnico era o Zezinho Miguel. O Zezinho falou: ‘o Rômulo que treinou, ele que vai jogar, mesmo que a gente apanhe de 10 a 0’. O placar foi 4 X 3, perdemos faltando um minuto para terminar o jogo. O time do Atlético Mineiro era formado por Kafunga, Nozinho e Alonso, Zé do Monte, Gilberto, Lucas, Ismael, Carlyne, Vavá, Garcia. Um jogo que ficou na história”, recorda ele, mostrando uma foto sua com as famosas Madrinhas do Atlético, em uma passeata na Rua Getúlio Vargas rumo ao campo, antes da partida.
“Nessa época, o campo do Atlético era de terra, sem muro, tira um buracão lá em baixo. O vestiário era uma casinha simples, coberta de palha. Não tinha praça de esportes. E a cidade toda era envolvida, apaixonada pelo futebol”, completa, entre dezenas de fotos que registram parte dessa história.
A fotografia era outra paixão de sua vida. Ainda guarda, com carinho, uma antiga maquininha com a qual registrava cenas pitorescas, não só da sua terra natal, mas também das várias cidades onde já morou e jogou futebol. Como em Abaeté os meninos só tinham como estudar até a quarta série, ele conta que fez o ginásio em Belo Horizonte, Pará de Minas e Sete Lagoas. “Era uma viagem demoradíssima. A gente ia de carro até Martinho Campos e de lá pegava a bitulinha (trem de ferro). Eu sempre batia retratos pela janela, achava bonito, era quase mata pura. Um dia, o trem descarrilhou na ponte do Paraopeba, todo mundo saiu com medo dele cair no rio. Registrei isso também”, diz.
Na capital mineira, Rômulo conta que treinava no Campo do Atlético, pertinho da Pensão da Dona Neném, onde ele morava e os jogadores do Galo almoçavam e jantavam. “Já conhecia o Kafunga e o Carlyle, quando joguei contra eles em Abaeté”, completa, recordando também o tempo em que fez o 3º ano e o Tiro de Guerra em Sete Lagoas e era sempre dispensado das atividades do final de semana para viajar com o time do Bela Vista. “Conheci muitas cidades nessas excursões, Montes Claros, Esmeraldas, Serro…”
Após se formar em Odontologia na Universidade Federal de Diamantina, em 1961, Rômulo voltou para Abaeté, onde jogou bola por mais sete anos. “Tive que parar por causa do trabalho. Se machucasse a mão, não poderia exercer a profissão”, lamenta.
Um orgulho que sente é o de integrar a primeira turma de professores da CNEG, uma equipe muito idealista, que trabalhou nos três primeiros anos sem receber nada, a fim de ajudar a fortalecer a escola criada por Dr. José de Campos Melo, para que os filhos de Abaeté tivessem como continuar os estudos após o primário. “Fui professor de Ciências e Matemática na CNEG e no Estadual e de Biologia no Colégio das Irmãs. Ia de bicicleta para a escola. Estavam fazendo o primeiro calçamento de Abaeté, na rua Getúlio Vargas, perto da praça da prefeitura. Era cheio de buracos, caí de bicicleta num deles. A bicicleta ficou e eu fui”, recorda, divertindo-se, entre outros casos e retratos.
*Matéria publicada na edição de fevereiro de 2029 do Nosso Jornal – com atualizações no primeiro parágrafo