
Por Edna Xavier – Consultora em gestão empresarial, finanças e desenvolvimento local
Abaeté sempre se destacou por ter um povo trabalhador e corajoso. Basta andar pelas ruas para perceber o tanto de empresas, escritórios, pequenos comércios e prestadores de serviços que movimentam a nossa economia. São mais de 3.300 negócios ativos para uma população pouco acima de 23 mil habitantes — um número que impressiona e coloca nossa cidade bem acima da média mineira em densidade empresarial.
Esse dinamismo é fruto de um perfil empreendedor que nos orgulha. Mas também revela algo que precisa ser discutido com seriedade. A maioria esmagadora das nossas empresas — quase nove em cada dez — são pequenos negócios, e mais da metade delas começa como MEI, o Microempreendedor Individual. Isso é excelente para estimular a formalização e dar o primeiro passo. Porém, apenas cerca de 35% conseguem avançar e virar uma micro ou pequena empresa mais estruturada, o que mostra o desafio que é escalar, crescer, criar raízes mais firmes no mercado.
O resultado é que vemos um movimento constante de portas que abrem e, pouco tempo depois, fecham. O município continua ganhando novos CNPJs todos os meses, mas ao mesmo tempo perde outros tantos, num vai e vem que mantém o saldo positivo, mas à custa de muita rotatividade. É um retrato claro de que abrir negócio, em Abaeté, não é o problema — o verdadeiro desafio tem sido garantir que ele se mantenha saudável, gere empregos consistentes, pague seus tributos e continue crescendo.
E aí surgem questionamentos que não podemos ignorar: será que parte desses novos CNPJs não está aparecendo apenas para driblar a CLT, transformando empregos que deveriam ser formais em falsos contratos de prestação de serviço? Será que essa alta formalização inicial não mascara uma base econômica que, na prática, não está consolidada como poderia? Essa é uma reflexão importante para todos que desejam ver o município se fortalecer de verdade, sem depender de expedientes frágeis que, no fim, prejudicam o trabalhador e a sustentabilidade dos negócios.
Do ponto de vista setorial, nossa economia continua majoritariamente dependente do consumo das famílias, com 55% das empresas no setor de serviços e 29% no comércio. A indústria representa apenas 17%, e a agropecuária, embora tenha raízes históricas fortes, fica restrita a 4%. Isso nos deixa vulneráveis a qualquer oscilação na renda da população e na confiança do consumidor. Quando o dinheiro aperta nas casas, o comércio sente, o prestador de serviço sente, e a conta chega rápido para o pequeno empresário.
Ainda assim, Abaeté tem bons indicadores que mostram um solo fértil para quem quiser empreender com consciência. Temos produtividade acima da média mineira, baixa vulnerabilidade social, uma infraestrutura de saúde relativamente boa e, felizmente, já contamos com o decreto municipal de liberdade econômica, que é um avanço importante para reduzir burocracias. Além disso, o município começa a dar seus primeiros passos na implementação mais robusta da Rede SIM, o que deverá facilitar ainda mais o ambiente de negócios, trazendo processos digitais que desburocratizam, agilizam e reduzem custos para o empresário.
Mas se queremos transformar essa vocação empreendedora em crescimento sustentável, precisamos dar atenção aos gargalos que continuam visíveis. A conectividade digital, por exemplo, ainda é só mediana, quando hoje qualquer empreendimento precisa de internet rápida e estável para fazer vendas online, emitir notas, controlar estoques, se comunicar com clientes e fornecedores. O salário médio da cidade, na faixa de R$ 2,2 mil, também revela uma realidade de mão de obra com menor qualificação técnica, o que torna difícil para muitos empresários encontrar pessoas preparadas para assumir funções mais complexas, liderar processos e contribuir efetivamente para o crescimento do negócio.
Além disso, falta planejamento de longo prazo e a construção de sucessão nos negócios familiares. Muitos empreendimentos dependem exclusivamente do dono, que faz de tudo um pouco: compra, vende, paga contas, gerencia pessoas, cuida de redes sociais. Quando ele adoece, envelhece ou simplesmente se cansa, o negócio corre o risco de fechar — levando embora empregos, impostos e a própria história construída ali.
Diante desse cenário, não posso deixar de perguntar: o que está faltando para que nossos pequenos negócios realmente ganhem força, avancem para outro patamar e possam resistir mais tempo no mercado? Será que nós, empresários, estamos nos preparando da maneira que deveríamos para gerenciar finanças, liderar pessoas, entender do nosso produto e do nosso público? Estamos formando profissionais no ritmo e na qualidade que a indústria, o comércio e o agronegócio precisam? Estamos pensando na sucessão para que o negócio continue forte, mesmo quando o dono original decidir descansar ou apenas se afastar?
Abaeté tem tudo para ser um polo regional de negócios cada vez mais sólido. Já mostramos que coragem e disposição não nos faltam. Agora, precisamos juntar a essa coragem a estratégia, a qualificação e a visão de futuro que façam nossas empresas não apenas nascerem, mas prosperarem e deixarem um legado para a cidade. Continuo aqui, como consultora e apaixonada pelo desenvolvimento local, à disposição para ajudar empresários, associações e o poder público a pensar soluções que consolidem esse potencial. Porque não queremos ser conhecidos apenas como a cidade que mais abre empresas. Queremos ser lembrados como a cidade onde elas permanecem, crescem e transformam vidas.