Conhecendo nossa história

Publicado na edição nº119 em Agosto de 2005

Integrante de uma tradicional família, cuja história se confunde com a própria trajetória de Abaeté, Dr. Aloysio da Cunha Pereira relembra fatos e curiosidades, numa verdadeira aula de história sobre a antiga política da cidade. Confira a entrevista que ele concedeu ao Nosso Jornal, ao lado de sua esposa, D. Derly:

Como começou a divisão político-partidária de Abaeté?

No início, a política de Abaeté era dominada pelo Barão do Indaiá. Uma filha dele era a minha tataravó, casada com o Tenente Ezequiel. Por volta de 1880, meutataravô viajou para o Rio de Janeiro, em missão política, e firmou um acordo com o chefe do Partido Conservador. Naquela época, gastavam-se três meses na viagem de ida e volta ao Rio. Quando o Tenente Ezequiel voltou, o Barão disse que tinha firmado compromisso com Martinho Campos, do Partido Liberal. Assim começou a divisão política de Abaeté. A corrente política do Barão prosseguiu sob liderança da família Álvares da Silva, no PSD. E a nossa família, liderada pelo meu avô, Dr. Vianna, seguiu a linha do Tenente Ezequiel, formando, mais tarde, a UDN.

Fale um pouco sobre o Dr. Vianna.

Meu avô, o médico e senador estadual Dr. José Cândido de Souza Vianna, veio de Curvelo por volta de 1885 e casou-se com a filha do Tenente Ezequiel. Com a morte do sogro, ele passou a chefiar sua corrente política. Foi presidente da Câmara Municipal por 18 anos, de janeiro de 1898 até dezembro de 1915. Naquele tempo, o presidente da Câmara era o prefeito e podia se eleger sucessivas vezes. Em 1915, ele perdeu a política para o Dr. Lili (Dr. Antônio Amador Álvares da Silva, eleito por quatro mandatos). Em 1930, veio a ditadura Vargas, que ficou prestigiando a família Álvares da Silva. Com o fim da ditadura, em 1946, disputamos novamente a eleição, agora pela UDN e derrotamos a turma do PSD, promovendo uma virada na política de Abaeté. Meu irmão, Dr. Edgardo, foi eleito prefeito e ficou no cargo até 1950. Depois, nós perdemos a política até 1971, quando eu fui eleito. Voltei à Prefeitura em 77 e 78.

Que lembranças o senhor tem desses tempos mais fortes da política?

Era uma política brava, violenta. Todo mundo andava armado, saía muito tiroteio. Por volta de 1950, a gente costumava jantar por volta de seis horas e saía para passear. Eu ía saindo, minha mãe me chamava: “Filho, você está armado?” “Estou.” “Então, pode ir”. E ela era religiosa de ir à igreja duas a três vezes por dia. Cheguei a  dar até muito tiro, mas nunca acertei ninguém e, felizmente, estou aqui até hoje.

A cidade toda era muito dividida, não é?

É, o Dr. Vianna era o médico de um lado; o Dr. Lili de outro. Depois, entraram o Dr. Canuto e o Dr. Amador. Dr. Canuto, no princípio, era do nosso lado. Depois, houve uma cisão, e ele formou uma terceira ala. No comércio, havia o Ângelo Defeo do nosso partido e o Jader Moura com os adversários. Quando a política se acirrou muito, o PSD fundou o “Nosso Clube”, enquanto nós frequentávamos o tradicional “Abaeté Clube”. E foi assim por muitos anos.

Conte algum caso interessante dessa época.

Desde pequeno, eu escuto a história do planejamento da cidade, contratado pelo meu avô, Dr. Vianna. Abaeté foi a segunda ou a terceira cidade planejada do estado e cresceu dentro desse planejamento, com ruas bem traçadas e avenidas largas…  Na época, também foi planejado o atual cemitério, em um local até então bem deserto. Abaeté ainda era o Marmelada, estava começando a subir para a praça da Matriz. Houve uma oposição forte contra o novo cemitério, chefiada pelo Chico Cocão. Por incrível que pareça, a primeira pessoa enterrada lá foi a filha desse comerciante. O novo cemitério foi inaugurado em 1909 e tinha o portão aberto para a Avenida Sete de Setembro. Quando Dr. Vianna perdeu a política, o prefeito contrário fechou esse portão e abriu um outro, na Rua Antônio Amador. Passados alguns anos, a política vira de novo, e Dr. Edgardo fecha o portão aberto pelos adversários, faz um muro e reabre a entrada pela avenida. Depois, a oposição vence novamente e volta o portão para a Rua Antônio Amador. E foi assim até que eu assumi a Prefeitura e resolvi acabar com essa história, abrindo os portões dos dois lados…

Abaeté nos anos 70

A família do senhor ajudou a construir boa parte de Abaeté, não é?

Numa reunião, há pouco tempo, foi dito que nossa família construiu cerca de 90% de Abaeté. O Banco de Abaeté foi fundado por meu pai e transformado em Cooperativa pelo meu cunhado, Dr. Melo, que também fundou o Abaeté Clube e a CNEC. O Ginásio Estadual foi uma das obras que conseguimos com o Governador Magalhães Pinto. Minha mãe (D. Alda Vianna) doou o terreno. A meu pedido, ela doou também quase a metade do terreno atual do Hospital São Vicente de Paulo e metade do quarteirão onde é hoje a Praça de Esportes.

Já a área onde foi construída a atual Rodoviária foi vendida por nós, pela metade do valor de mercado. Muitos loteamentos foram feitos em antigas fazendas da família: parte do Centro, do Bairro Amazonas, os bairros Simão da Cunha, Santa Terezinha e Quintas da Invernada. Grande parte do que fica da Avenida Simão da Cunha para baixo eram terras do meu avô, que passaram para minha mãe e para os filhos.

A Escola Estadual “Senador Souza Viana” foi outra obra que consegui com o Magalhães Pinto. Trouxemos a Copasa, a Cemig, a Telemig. Quando prefeito, fiz o primeiro asfalto de Abaeté. Abri e asfaltei a Avenida Barão do Indaiá, na descida do João da Eva até a ponte. Aquilo ali era um beco, quem morava lá vivia atolado na época de chuva. Depois, asfaltei o Marmelada, na descida para a CNEC, e o acesso ao Estadual.

Naquela época, o prefeito não tinha uma boa remuneração…

É, acredito que eu ganhava algo em torno de um ou dois salários mínimos. Andava no meu carro, mas comprei para a Prefeitura dois caminhões novos, uma retroescavadeira, uma patrol, um trator e dois jipes, sendo um para a Emater. Fiz uma reforma administrativa que foi modelo para várias cidades da região, organizando a Prefeitura em Departamentos (Administrativo, Finanças, Educação, Estrada, Urbanização, Saúde). E deixei o da Saúde criado. Naquele tempo, saúde não era competência do município. Depois, os prefeitos foram transformando os Departamentos em Secretarias. Hoje, estou afastado da política, mas continuo pensando no progresso de Abaeté. Agora mesmo, estou mexendo uns pauzinhos, para ver se consigo construir uma sede própria para a APAE. Doei uma chácara para essa construção.

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