Por Associação Águas de Abaeté
No momento precedente às eleições municipais, é comum que os cidadãos façam algum ‘balanço geral’ sobre diversos aspectos da vida social na cidade. A Associação Águas de Abaeté, instituída formalmente em 2021 como organização da sociedade civil com o objetivo de atuar e promover melhoria da qualidade ambiental em nossa região, propõe um olhar panorâmico sobre o ambiente natural e urbanístico na cidade. Uma discussão que merece ser ampliada, para que a municipalidade depreenda melhores ações em proveito da transformação positiva da cidade.
Nos últimos 20 anos, em ritmo acelerado, diversos bairros passaram a ser configurados ou vêm sendo ampliados em Abaeté, como o São Francisco, Bela Vista, Sagrada Família, Santa Luzia, Cidade Nova, Residencial Serra, partes do Progresso, do Santa Terezinha, dos Nerys, dentre outros. Paralelamente, multiplicam-se parcelamentos do solo para dar lugar aos chamados chacreamentos e aos condomínios horizontais, em áreas ou zonas antes rurais, como no entorno da Represa de Três Marias, na Região das Tabocas e outros.
Se esse processo de urbanização traz benefícios econômicos, pela circulação de bens e serviços, também gera impactos ambientais e urbanísticos negativos. Citamos os prejuízos advindos da supressão danosa e descompensada de fragmentos da flora nativa ao longo das calhas e das margens dos cursos d’água remanescentes no meio urbano, destacadamente no Córrego dos Cachorros, no Córrego Olhos D’água e no Ribeirão Marmelada, em notório contrassenso às demandas do nosso tempo.
A urbanização mal conduzida faz avançar e assentar ruas e lotes também sobre Áreas de Preservação Permanente – APPs, estrangulando e asfixiando córregos, ribeirões e lagoas, mananciais de águas naturais, com efeitos que se refletem no clima local, na disponibilidade hídrica, no patrimônio coletivo, na estética e na organização da cidade, na vida de seu povo.
Já o implemento extensivo de bairros caracterizados pela inexistência de espaços suficientes e servíveis ao convívio social, como praças e parques, e pela diminuição exagerada do tamanho dos lotes, da largura das calçadas e das ruas, impõe um adensamento demográfico e degradação urbanística. Em meio a isso, verificam-se entregues aos cuidados do poder público amplos bairros ou loteamentos, cujas estruturas, como pavimentação, esgotamento sanitário, drenagem de águas pluviais, revelam-se subdimensionadas, mal feitos, demandantes de vultosa manutenção corretiva.
Some-se toda a grosseira alteração arquitetônica evidenciada na cidade pela substituição dos elegantes e antigos casarões por edificação predial indisciplinada. Há, ainda, as ocupações inapropriadas, como marquises que avançam exageradamente sobre calçadas; vias públicas sem afastamentos frontais convenientes e com espaços reduzidos para a circulação das pessoas.
Nessa reflexão, também é necessário contabilizar agravos significativos associados à supressão de amplas porções de formações florestais em áreas rurais, previamente destinadas às Reservas Legais. Observa-se que, subitamente, como num truque mágico por vezes decretado pela Administração Pública, espaços territoriais são transpostos do domínio rural para o urbano, e, com a mudança, se afasta a proteção ambiental pelo instituto da Reserva Legal, culminando na supressão de tudo aquilo natural preexistente, sem contrapartidas ecológicas adequadas. Com isso, desaparecem a flora nativa, a fauna silvestre, as águas naturais, a paisagem, deteriora-se a qualidade do ar.
Acrescente-se, também por sua importância, danos resultantes do descuido com a arborização urbana em ruas e praças. Cidades bonitas e agradáveis se fazem a partir da compreensão dos indispensáveis serviços ambientais e ecológicos que a arborização oferece, como sombreamento e proteção contra a radiação solar, atenuação do calor, beleza paisagística, abrigo e alimento para a fauna, recarga hídrica dos reservatórios subterrâneos, proteção ao solo; aumento da umidade do ar, controle da poluição atmosférica e da dispersão sonora, conforto às pessoas.
Centros e cidades referenciais em urbanização priorizam a arborização e os lagos na composição de parques e praças. Em Abaeté, observa-se persistente estado de dificuldade para a revitalização daquilo outrora existente, como o caso dos lagos na Praça da Matriz. O escopo de projetos básicos concebidos para a Praça da Prefeitura e para a praça que designam parque ecológico deixa perceber que, por aqui, ainda se prioriza a construção fundada no concreto e no ferro. Desperdiçam-se oportunidades de oferecer à população praças urbanas dominadas pela arborização bem cuidada, com sombreamento entremeio amplos gramados, que propiciem embelezamento e conforto.
Também reclama atenção e enfrentamento a gestão dos resíduos sólidos urbanos, especialmente porque a disposição irregular em ‘cantões’ da cidade persiste, poluindo e perturbando a saúde e o bem-estar da população. Convivemos ainda com absurdos amontoados de toda espécie de resíduos sólidos dispersos cotidianamente em determinados espaços da cidade, como na sua entrada pelo trevo do Bairro Jardim Primavera, ou nos bordos do Bairro Bela Vista, ou ainda na encruzilhada de acesso à estrada vicinal que interliga o meio urbano à Represa de Três Marias. Não há Jardim ou Bela Vista, nem espaço algum que resista sendo agredido pela sujeira cotidiana da descarga dos resíduos sólidos e frente à indiferença na postura do poder público local.
Entender e reconhecer toda essa realidade do município de Abaeté, do modo perverso, danoso e inconsequente com que estamos lidando com seu ambiente natural e direcionando sua urbanização, constitui ponto de partida para remediação.
A Associação Águas de Abaeté crê na possibilidade do contorno e da superação das adversidades, com efetivo implemento consorciado de diversas medidas, todas complementares, a seguir correlacionadas para que sejam avaliadas e consideradas em busca do saneamento desejável.
1 – Dedicar órgão municipal específico à matéria, como uma Secretaria Municipal de Meio Ambiente que seja atuante no tratamento das questões discutidas e afetas ao ambiente natural e à urbanização na cidade.
2 – Instituir e dar funcionamento efetivo ao Conselho de Desenvolvimento Municipal do Meio Ambiente – Codema, em moldes verdadeiramente comprometidos com interesses da coletividade.
3 – Criar e manter disponível e atualizado ‘Portal da Transparência’ pela Administração pública, a fim de possibilitar conhecimento e acompanhamento, por qualquer interessado, do andamento processual e procedimental de empreendimentos causadores de maiores impactos econômicos, sociais e ambientais, como parcelamentos do solo.
4 – Formar e instituir ‘Comissão Técnica para Análise Urbanística’ composta por profissionais técnicos com interesse, competência e habilidades para revisar normas urbanísticas locais, lei diretora e de usos e ocupações, de modo a empreender revisão e, com suporte em modelos referenciais, apresentar proposições voltadas à melhoria da cidade, inclusive da sua disciplina arquitetônica básica.
5 – Privilegiar no meio urbano municipal, em cruzamento de vias, o Trânsito por Rotatórias, fazendo com isso reduzir o tempo de deslocamentos, os custos de manutenção, a sobrecarga de cabeamentos e acessórios que degradam a cidade.
6 – Instituir ‘Programa Municipal de Recomposição da Flora’, mediante instalação de viveiro ou berçário municipal para produção de mudas, privilegiando espécies nativas, de forma a propiciar insumos para a recomposição e ampliação da arborização urbana, para restauração ecológica de APPs.
7 – Instituir pelo menos uma primeira e verdadeira Unidade de Conservação da Natureza, com fundamento na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. É possibilidade, por exemplo, a instituição de ‘Parque Natural Linear’ ao longo das calhas dos Córregos Olhos D’água e Cachorros e o Ribeirão Marmelada, em dimensões e capacidade para, prioritariamente, proteger os mananciais de água que atravessam o núcleo urbano, a ela integrando um Centro de Estudos, Educação e Conhecimento Ambiental, onde a população possa melhor compreender seu ambiente.
8 – Realizar Avaliação Técnica da Disposição de Resíduos Sólidos Urbanos, em pormenores e que contraponha vantagens e desvantagens, ambientais e econômicas, da disposição de resíduos sólidos em aterro sanitário no município frente ao uso corrente de equipamento situado em Bambuí. Nessa avaliação, também se faria levantamento diagnóstico da situação da disposição irregular de resíduos diversos, como de escória das atividades de construção civil, de modo a delinear formas, local e espaços apropriados disposição final da matéria residuária.
9 – Incentivar a população, destacadamente comerciantes e lojistas, a participar permanentemente de ‘Programa de Parceria para Redução da Geração de Resíduos Sólidos’ no município, com especificação de benefícios e subsídios para o alcance de metas progressivas de redução.
10 – Enfrentar efetivamente a disposição irregular de resíduos sólidos por atuação permanente, mediante instituição de ‘Programa de Orientação à População’, chamando a população a participar ativamente da mudança. A esse programa, deve-se integrar instalação de placas proibitivas; cercamentos apropriados; fiscalização periódica; aplicação de sanção perante o ilícito flagrante.
11 – Promover, praticar e apoiar periodicamente ‘Campanhas Educativas para Conscientização Ambiental’ em veículos de imprensa e eventos de amplitude no municipal ou regional.
12 – Disponibilizar ‘Programa Disk Entulho’ para orientar e apoiar a população na destinação adequada de resíduos sólidos.
13 – Restringir e minimizar impactos ambientais e urbanísticos da interligação de espaços urbanizados sobre córregos, como no caso das proximidades do Bairro Bela Vista ao centro, onde deve haver no máximo a interligação por uma via adicional, fazendo preservar integralmente o remanescente de áreas verdes que entremeiam o espaço urbano.
14 – Editar e publicar ato normativo, ‘Lei dos Condomínios Horizontais ou Chacreamentos’, a partir da revisão da legislação atual e de boas referências.
15 – Priorizar nos espaços públicos, ruas e praças, elementos naturais, como arborização e gramados, restringindo usos de estruturas de concreto e ferro ao estritamente indispensável.
16 – Acompanhar o processo de saneamento básico dos efluentes sanitários de origem doméstica, ampliando o tratamento e as interligações acessórias até que a integralidade da carga poluente seja afastada dos córregos e ribeirões.
Fotos: Abadrone e arquivo Nosso Jornal